Si Caetano
sexta-feira, junho 08, 2018
Avulsos
A morte do desejo
Morreu e deixou uma mensagem para ela, no meio das coisas achadas, numa folha de caderno. Ela sofreu, se sentiu culpada, achava que deveria ter dito coisas a mais, coisas que supostamente não disse. Chora, começa a investigar como foi que tudo aconteceu, pergunta amigos, vai atrás de pistas. Acorda. Cai em si, lembra que ela e a tal pessoa não se falam mais como antes. Se sente estranha, pega o celular e ameaça fazer o que qualquer pessoa faria, falar com a pessoa, perguntar como está, tentar sondar sobre sua vida, invadir o silêncio, a distância e o abismo de coisas só existiram na sua imaginação. Fingiu por um segundo que não entendeu o que aquilo significava.
Assim ela fez o que nem todo mundo faria, respirou antes de fazer qualquer coisa, fechou o coração, levantou e lavou o rosto, fez uma viagem à realidade, trouxe de volta os fatos, abraçou a verdade e pediu que ela não te virasse o rosto, nem falhasse com ela.
Mas a verdade veio junto com o abrir dos olhos naquela manhã, a morte do que nunca existiu foi um grito maior do que qualquer tentativa de contar uma bela história que não acha fundamento. A verdade falou com aquela dor de reviver memórias e disse o que ela custou a admitir lá atrás quando tudo aconteceu.
Morreu. Morreu mesmo, há muito tempo, a pessoa, a história que ela contou, o sentimento que criou e a razão de existir desse espaço que ainda lhe habitava. Essa era a oportunidade do enterro. Era o velório que já foi feito há muito tempo, mas por alguma razão, o inconsciente não deixava perceber. Hoje ele preparou a cerimônia e ela compareceu.
Sempre podemos ressuscitar os defuntos ou enterrá-los de vez. Hoje a verdade pediu por favor deixe os mortos cuidarem dos mortos, cuide da vida que te habita no presente. Deixe o passado gritar sozinho, você já não está lá. Ela ouviu e mais uma vez acordou, agora por dentro.